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Parecer ao documento preliminar BNCC, 2016

Frenéticas/Anos 70, Escola Estadual Alfredo Paulino, SP
Parecer sobre BNCC – Base Nacional Comum Curricular Componente Curricular Arte – Área Linguagens

Introdução
Introduzo o parecer que se segue dividido em tópicos, com este escrito inicial. Tendo analisado os trechos apontados para uma minha “leitura crítica” do componente curricular ARTE, pertencente à área linguagens deste documento relativo à BNCC- Base Nacional Curricular, em primeiro lugar quero ressaltar que dele se depreende o esforço de muitos- técnicos, assessores, especialistas, gestores, em projeto de construção de longo curso, circunscrito não somente ao período que se estende de meados de 2015 até este janeiro, mas de todos aqueles que em várias etapas e topologias do ensino brasileiro, vem trabalhando, pensando e lutando pela qualidade crescente da educação básica, sobretudo depois da Constituição Federal de 1988.
Participar de uma etapa deste processo, tanto na reunião acontecida em 11 de janeiro de 2016, na SEB- Secretária de Educação Básica, MEC- Ministério da Educação (Brasília, DF), a outra contribuição sendo este parecer, possibilitou-me a possibilidade de uma potente reflexão organizada, iniciada também junto a meus pares no Instituto de Artes da UNICAMP, a partir de novembro de 2015, quando convidada a participar do processo.

Para esta reflexão convergiram muitos dados, tanto aqueles notoriamente produzidos ao longo de minha carreira de pesquisadora em dança (na UNICAMP e no IDART- Pesquisa e Informação em Arte, Arquivo Multimeios, Secretaria Municipal de Cultura/São Paulo), quanto alguns outros tantos, provenientes de duas trajetórias.
A primeira: uma formação escolar quase totalmente cursada em escolas e universidade pública (à exceção de um doutorado na PUCSP) e a segunda: uma volta, em outro papel, à topologia de ensino público, a qual retorno, em outro papel, mediante a entrada de minha filha em escola pública estadual na cidade de São Paulo.
Isto posto, já adianto, como se pode perceber, que meu parecer, ao contrário de tantos, emitidos dentro da carreira universitária, se organiza na primeira pessoa do singular, em consonância com os debates que venho travando com colegas e pela forma que ora elejo para aqui falar-traduzir-escrever-expressar meus pontos de vista sobre o documento preliminar.
A partir dele, ao esforço de trabalho pressentido por entre sua estrutura, vem se agregar à percepção de estar também frente a uma colcha de retalhos, tecida por e entre especialistas provenientes de muitos territórios, em trama mediante a qual se insiste no esforço da unidade e coerência.
Por tudo isto, o documento traduz consensos e dissensos, que se apresentam como contradições mais ou menos aparentes, em um momento pautado por disputas entre territórios de muitas naturezas, a partir de regras, leis, decretos e normas.
Como os consensos e dissensos serão resolvidos em formato articulado? Saberemos disto quando da aprovação final da BNCC, fruto de um tempo histórico, este.

Algumas destas contradições (e às vezes certas lacunas), mais ou menos presentes nesta versão da Base, seguem abaixo analisadas, a partir de minha leitura crítica do documento e seus princípios. Abaixo, seguem estas análises, numeradas ponto-a- ponto, reunidas sob quatro tópicos, organizados a partir dos títulos analisados deste texto da Base:

Tópico I- Princípios Orientadores da Base Nacional Comum Curricular
Tópico II- Documento Preliminar à Base Nacional Comum Curricular – Princípios, Formas de Organização e Conteúdo Tópico III- Área: Linguagens
Tópico IV- Componente Curricular ARTE 

Como se verá, debrucei-me sobre questões e temas sobre os quais tenho considerações a fazer. Quando ao restante dos pontos, nada teria a colocar, os conteúdos dos tópicos sendo considerados como condizentes ao que se propõem.
Finalmente, mais uma informação: expressões, frases e excertos que neste parecer se apresentam entre aspas referem-se a textos pertencentes ao texto atual da BNCC.

TÓPICO I- PRINCÍPIOS ORIENTADORES DA BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR

Ponto 1
À      página          8,       o        texto   se       refere a         “participar     e        aprazer         em entretenimentos de caráter social, afetivo, desportivo e cultural”. No que diz respeito ao componente curricular ARTE - que parece se inserir no escopo do que nesta frase se aponta como “cultural”: seria interessante um outro tipo de construção da sentença, que apontasse para a arte como um componente que, resguardadas as ações do entretenimento este talvez tendo seus contornos alargados para os conceitos do lazer- se apresentasse como base e processo de conhecimento em si, para além do divertimento strictu sensu.

Ponto 2
À página 10, o documento se refere a todas as áreas do conhecimento, como o expresso na frase “serão mobilizados recursos de todas as áreas do conhecimento. ” Neste caso toma-se por “todas” as quatro áreas de conhecimento apresentadas no documento ou mais áreas do conhecimento humano?

Ponto 3
À página 10, o texto se refere a “vivência da cultura como uma realização prazerosa”, estamento que me parece apresentar sérias questões. Sem querer aqui fazer uma apologia da privação de prazer, da dor ou do sofrimento, não me parece adequado conotar- se à “vivência da cultura”, estrato onde a arte se insere em algumas das considerações mais gerais do documento, à realização prazerosa, em detrimento da dúvida ou da curiosidade que incomoda, da estranheza frente ao diferente, do susto pelo diverso, da insegurança para um pensamento para fora dos contornos mais conhecidos, etc., tudo isto inerente a processos educacionais em arte em qualquer instância do mundo contemporâneo e desde - pelo menos como programa manifesto das artes- de mais de 150 anos.

Ponto 4
Dentro do mesmo assunto tratado no ponto anterior, e à esta mesma página, 10, o texto se refere à “percepção e o encantamento com as ciências como permanente convite à dúvida”, o que me parece uma questão a ser retificada, haja vista que a percepção e o encantamento fruto do “permanente convite à dúvida”, podem estar presentes não somente nas ciências, mas também nas outras áreas (e seus componentes) do documento ora analisado, como nas linguagens e na matemática.

Ponto 5
À página 10, a frase que cita “as atividades lúdicas, como brincadeiras e jogos, artísticas, como o desenho e o canto”, deveria limitar-se a não listar o tipo de atividade artística a que se refere, ou ao contrário: caso se mantivesse a necessidade da citação, que se elencasse, pelo menos um exemplo de cada um dos quatro campos da arte que compõem o todo do componente ARTE: artes visuais, dança, música e teatro.

Ponto 6
À página 11, no parágrafo que trata dos anos finais do Ensino Fundamental, quando “a dimensão lúdica das práticas pedagógicas adquire outras características”, a impressão transmitida pelo documento é de que, a neste momento o compromisso educacional seja, proeminentemente, com o processo de letramento, em suas diversas dimensões, dentre elas as artísticas. O enunciado pode ser entendido como uma prevalência do “processo de letramento”, em suas múltiplas acepções, sobre outros processos advindos do proposto por uma base curricular única. Neste mesmo parágrafo o texto se refere a “diferentes componentes” que podem requerer vários recursos matemáticos, em diversos contextos”. Sugere-se que este excerto seja reescrito para deixar-se claro a autonomia de cada área (e componentes) para que o que se aponta, neste mesmo parágrafo como uma “articulação interdisciplinar consistente”, possa até mesmo vir a acontecer. Sobre a questão interdisciplinar, versa também o próximo ponto, 7.

Ponto 7
À página 8, o texto demanda “uma articulação interdisciplinar consistente”. Pergunta-se: do que se trataria este caráter interdisciplinar e, ainda, a sua qualificação como portador de uma consistência? Desde o início da leitura o “interdisciplinar” ou a “interdisciplinariedade” vão aparecendo por entre o texto analisado, ensejando uma questão: qual o sentido destas palavras ao longo do texto, a partir de qual topologia teórica estão sendo usadas e com qual intuito?
Desta maneira, o “interdisciplinar” aparece recorrentemente, mas não suficientemente explicitado. Utilizado, aparentemente, com o intuito de fazer convergir questões para uma unidade do escopo geral da Base, estaria ainda se apresentando com o intuito de estabelecer uma metodologia de trabalho, propositiva e não necessariamente determinante- para os programas da educação básica que a ele acederiam a partir de suas realidades, organizadas na e pela “parte diversificada”?
Neste momento, deixo de indagar e tomo a liberdade para refletir sobre a interdisciplinaridade, em três níveis, a saber:

Em primeiro lugar, como locus entre territórios, eventualmente estruturando-se como um território em si, por exemplo, na performance, que nas artes do espetáculo, apresenta-se, inicialmente como um “hibrido entre artes”, consolidando-se, até o presente momento, como um território autônomo da cena ampliada.

Em segundo lugar, como uma estratégia metodológica de junção de diversos, para fins determinados a curto, médio ou longo prazo, como o verificado como metodologia política (e à época, a possível) na unificação da educação superior na União Europeia (U.E), hoje simplesmente Europa, a partir da Declaração de Bologna (1999), revisitada em sucessivas reuniões de ministros da educação. Neste caso, o proposto, visto, revisto, aplicado e reaplicado encontrou no “discurso da interdisciplinaridade” guarida político-operacional para a resolução de muitas questões, mas gerou, por outro lado uma onda, ousaria dizer vagalhão, de “interdisciplinaridade” institucional e curricular, que bateu em praias e penhascos de outros continentes do planeta.

Em terceiro lugar, como uma forma de trabalhar o dia-a-dia de currículos educacionais, desde que a especificidade dos programas, professores e alunos assim o demandem e permitam.

Com tudo isto, não se quer dizer que o franqueamento de novos lugares da educação em arte estabelecidos entre territórios construídos no entrecruzamento de matrizes de campos específicos (e de suas histórias educativas) não sejam interessantes, e, algumas vezes, até fundamentais, posto que reveladores de identidades, geralmente inventivas e desestabilizadoras de status quo. Ou seja, a interdisciplinaridade pode e deve ser proposta como indicação processual (ou metodológica), mas não imposta como uma disciplina a mais, fato que contradiz o seu próprio sentido, inclusive semântico.

Ponto 8
À página 9, primeiro tópico, para evitar-se uma divisão maniqueísta, apontada no excerto “entre práticas corporais e intelectuais”, polarizando-se, de maneira reducionista, corpo e intelecto, a redação, talvez, pudesse ficar desta maneira: “Experimentar vivências, individuais e coletivas, na área da linguagem, da matemática, das ciências humanas e da natureza, em situações significativas”.

Ponto 9
À pagina 12, há uma menção às áreas (e componentes curriculares) que se articulam para promover a apropriação de diferentes linguagens. A este respeito, que linguagens seriam estas? Aquelas conotadas como os componentes da “área linguagens”, ou o vocábulo apresenta-se como uma generalização a mais? A tratar-se do último caso, qual seria o conceito de linguagem a que se refere esta menção?

Tópico  II-   Documento  Preliminar  à   Base  Nacional         Comum Curricular – Princípios, Formas de Organização e Conteúdo PÁGINAS (13-16)

Ponto 1
Às páginas 13 e 14, quando o documento se refere à organização do texto em quatro áreas do conhecimento, aponta que tal organização visaria “superar a fragmentação do conhecimento escolar pela integração e contextualização desses conhecimentos”. No que diz respeito ao componente ARTE, esta forma de redação pode apontar para um temor no que toca à questão de “professores especialistas”, cuja paulatina introdução no ensino como um todo é uma das metas para o ensino integral. O temor seria o do fortalecimento do, já presente, protagonismo do licenciado em “educação artística”, em detrimento de um protagonismo dos licenciados em artes visuais, dança, música e teatro.

Ponto 2
À pagina 14, no excerto de texto que introduz os temas integradores, discorre-se sobre o que estes contemplariam, para além da dimensão cognitiva, ou seja, as “dimensões política, ética e estética na formação dos estudantes”. Talvez a frase merecesse uma mais equilibrada redação, pois quer parecer que se exclui da dimensão cognitiva, as dimensões política, ética e estética da educação humana. Quer me parecer que uma oposição entre os dois polos- o cognitivo versus os outros três citados também enquanto dimensões- o que vai de encontro a qualquer processo de educação integrada, como a também preconizada pelo documento ora analisado.

Ponto 3
À página 14, apresentam-se os temas integradores, aos quais a sugestão seria a de acrescentar mais um: o da acessibilidade total para crianças, jovens e adultos, também a partir da Lei 13146/2015, que trata da Inclusão da Pessoa com Deficiência, chamada de “Estatuto da Pessoa com Deficiência”, aprovada em julho de 2015.

Ponto 4
À página 15, quando o documento se refere à principal questão que mereceria aprofundamento e especial atenção em seu processo de debate/revisão, qual seja as “condições de acessibilidade aos estudantes deficientes, com transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades”, aponto para a importância do componente ARTE, da área das linguagens neste universo a ser ainda mais democrática e institucionalmente desbravado e de maneira sistemática, ou seja: sem cessar. A forma de existência dos campos do componente ARTE (artes visuais, dança, música e teatro), a qual subjazem suas formas de ensinar, abrange um vasto sistema de comunicação para-verbal e pré-verbal, que introduz crianças, jovens e adultos com deficiência em um mundo onde os significados podem ser construídos de maneiras diversas, sem prevalência de uma expressão ou outra, permitindo a experiência que se estruture através de performances múltiplas, onde metas (e avaliações) são moduladas, preponderantemente, a partir do indivíduo dentro do grupo e não ao contrário.

Ponto 5
À pagina 16, especificamente quanto ao papel da parte comum da BNCC na “proposição de diferentes trajetórias acadêmicas para estudantes do ensino médio”, uma reflexão: no elaborar-se destes trajetos individuais desta fase, os campos do componente curricular ARTE poderiam assumir um protagonismo maior, a partir de especificidades da arte como um todo, mais especificamente por sua busca da expressão do indivíduo a partir de suas idiossincrasias, em relação ao contexto cultural onde se insere, a escola ai colocada, em vivência educacional como desafio constante.

TÓPICO III- ÁREA: LINGUAGENS

Ponto 1
À página 29, quando o texto imputa à “área de Linguagens uma importante tarefa na Educação Básica” (por sua transversalidade à todos os componentes da base curricular), qual seja, a de: “garantir o domínio da escrita, que envolve a alfabetização, entendida como compreensão do sistema da escrita alfabético-pedagógica, e o domínio progressivo das convenções da escrita, para ler e produzir textos em diferentes situações de comunicação”, parece estar se referindo, primordialmente à Língua Portuguesa, um dos componentes da área Linguagens. Contudo, a transversalidade atribuída à área Linguagens (como um todo) faz parte do enunciado deste excerto de texto. Por este motivo, estas informações introdutórias deveriam ser mais bem trabalhadas em busca de uma hierarquia mais equilibrada – e menos ambígua - entre os componentes desta área.

Ponto 2
À página 32, apresenta-se o último objetivo geral da área das Linguagens no Ensino Fundamental: “Reconhecer a dimensão estética e poética como constitutiva das linguagens, apreciando a cultura, a arte e a língua como patrimônios. ” A poética e a estética, grandes palavras que remetem a sólidos debates nos escopos, entre outros, da filosofia, semiótica e teorias da arte, mereceriam uma mais aprofundada menção, sobretudo por se agruparem, sob o pálio da área Linguagens, componentes curriculares de diferentes matrizes originais. É dizer-se: de que poética e que estética se fala em relação aos quatro componentes da área Linguagens?

Ponto 3
À mesma página, 32, e sobre o objetivo analisado no Ponto 2, acima: sugere-se ainda o desmembramento deste objetivo em dois, a saber:
um objetivo em que as menções da estética e poética possam aparecer mais esmiuçadas;
outro objetivo no qual a questão da apreciação da cultura, arte e língua possa ser encarada como apreciação do patrimônio em sentido amplo, a cultura, a arte e a língua como tradições a serem apreciadas, também pela atualização promovida pelo ensino a cargo por especialistas que compartilham com seus alunos mesmos espaços no tempo contemporâneo.

Ponto 4
À página 37, dentro da lista dos objetivos gerais da área de Linguagens no ensino médio, tem-se a frase: “Apropriar-se do patrimônio cultural, compreendendo a diversidade das culturas brasileiras e estrangeiras, bem como o processo de disputas e da

legitimação de culturas que acontece, fundamentalmente, pela via da linguagem”. Sobre o enunciado, seria importante frisar que as ações formativas e pedagógicas referentes a este objetivo devam ser conduzidas, até por conta de sua importância capital, por licenciados que - em sua formação - tenham estudado de maneira continua e específica as maneiras desta apropriação, que em dança podem ser as formas de reposição de repertório, sejam da cultura tradicional ou não.

Tópico IV- Componente Curricular ARTE (PÁGINAS 96-107)

Ponto 1
À pagina 96, no bojo de um texto introdutório de boa qualidade técnica, denomina-se subcomponente a cada uma das quatro artes, às quais, no exercício pedagógico, se agregam as práticas integradas como a performance, a instalação, a videoarte, o circo, a videodança, a ópera, etc., em fundamental conexão ao rico e contemporâneo panorama da arte atual.
No entanto, o vocábulo “subcomponente” não faz jus a cada uma destas artes neste texto preliminar. Para substituí-lo proponho a palavra campo, à semelhança de seu uso, bastante corrente em circuitos de formação, produção e difusão da arte e em sua pesquisa e ensino, fora e dentro da academia. Como pode ser notado, em pontos anteriores ao presente ponto, já venho me referindo aos subcompontes do componente ARTE (artes visuais, dança, música e teatro) através do vocábulo campos. E assim também será feito, a partir de agora.

Ponto 2
À página 97, em parágrafo específico ao campo da dança, que comporta, de maneira clara e fundamental, o cerne da discussão sobre esta arte, algumas considerações:

Quando da menção da expressão “corpo em movimento”, frisar-se que este corpo em movimento se refere ao corpo em movimento em dança, e

Ao final do parágrafo, quanto ao excerto “visando, especialmente, a autoria, a inventividade e o respeito ao outro por meio da experimentação dos diversos modos de perceber e realizar a dança na atualidade”, sugere-se algumas modificações, referentes ao que sejam as expressões dança e experimentação e dança na atualidade, especificando-se um tanto mais estas expressões.

A partir disto, o excerto poderia seguir assim grafado: “visando, especialmente, a autoria, a inventividade e o respeito por meio da experimentação, da revisão e da reatualização dos diversos modos de perceber e realizar a dança, em sentido amplo e democrático, sem o estabelecimento de clivagens hierárquicas entre todas as atuais formas de sua manifestação na cultura e na arte”.

Ponto 3
À página 98, ao final do último parágrafo, temos a frase: “Do ponto de vista histórico, a Arte propicia ao sujeito entender a gênese dos costumes e valores constituintes de diferentes culturas, manifestadas em seus produtos artísticos”. Entende-se o fundamental conjunto de

ideias que a mesma resume, mas sugere-se que - para um seu melhor entendimento - que a ela se agregue ao significado de entender aquele do perceber, posto ser um indicador mais amplo a apontar para uma educação em arte, para a qual convergem os cinco sentidos da percepção (e da propriocepção e cognição humanas), em assunto problematizado por vários pensadores e teóricos ao longo dos tempos, até mesmo por Karl Marx, como em sua frase: A educação dos cinco sentidos é trabalho de toda a história universal até agora, encontrada em “Manuscritos Econômico-Filosóficos de 1844” (org. Florestan Fernandes, 1989, São Paulo: Ática) e recentemente aludida em reedição póstuma do poeta e pesquisador Haroldo de Campos (2013, São Paulo: Iluminuras).
Por fim, em relação à frase da página 98, também se sugere a incorporação de dois outros vocábulos, a saber:

Recriar, apontando-se para a materialidade da ação criativa, que engloba como o apontado no componente ARTE para a teoria encampando a prática e, vice-versa;

Bem artístico, ao lado de produto artístico, apontando-se para a arte como objeto não somente de consumo, mas sobretudo de fruição.

Tudo isto dito, a sentença em questão poderia ser assim reescrita: “Do ponto de vista histórico, a Arte propicia ao sujeito entender, perceber e recriar a gênese dos costumes e valores constituintes de diferentes culturas, manifestadas em bens e produtos artísticos”.

Ponto 4
À página 99, a escolha para denominar por dimensões os itens a “articular de forma indissociável e simultânea” foi, de fato, acertada. Sugiro apenas que estas seis dimensões sejam elencadas em ordem alfabética, evidenciando-se a ausência de hierarquia relativa ao nível da importância de cada uma. Assim teríamos as dimensões apresentadas desta maneira: criação, crítica, estesia, expressão, fruição e reflexão.

Ponto 5
À pagina 101, no penúltimo parágrafo, sugere-se que a referência à “hierarquia”, venha acompanhada de uma elucidação de qual tipo de hierarquia quer se tratar.

Ponto 6
À pagina 102, inicia-se a ordenação dos objetivos de aprendizagem no ensino fundamental I. No que toca ao campo da dança, questões:

No item que se identifica pela terminação 008: introduzir ao final da frase: a partir das matrizes da dança.

No item que se identifica pela terminação 009: modificar a expressão “pelos corpos em movimento”, substituindo-a pela expressão “pelos corpos em movimento de dança”.

Em relação ao item que se identifica pela terminação 012, no que toca às “matrizes estéticas e culturais”, se faria necessário no texto que introduz esta parte do documento uma elucidação

a respeito destas matrizes, à semelhando do também sugerido, mais acima, em relação aos termos poética e estética.

Como contribuição para esta elucidação, sugere-se que o entendimento do que sejam matrizes artísticas e culturais não se limite somente a um entendimento de sua ontologia (O que são estas matrizes?), mas também às formas de seu funcionamento, na concretude de cada manifestação cultural e artística (Como operam estas matrizes? Qual o modo de seu funcionamento?), abarcando-se os processos formativos e pedagógicos que deste entendimento resultam.
É dizer que as matrizes que embasam os processos pedagógicos em dança - também presentes nas formas tradicionais da cultura como um todo- operam à maneira da arte e como tal devam ser abordadas por licenciados, formados em graduações onde a criação composta de elementos da invenção, originalidade, expressão individual e coletiva- é um dos fundamentos dos programas aplicados. A ação dos especialistas deve ser fundada nesta especificidade, fruto da vivência em arte da dança, a partir duma das bases de seu fundamento de origem do movimento em arte - a invenção.
Ou seja, não se limita somente ao que se quer fazer em dança, mas à maneira da organização do que se ambiciona fazer, em processos educacionais onde a reunião, organização, disseminação e, portanto, produção de conhecimento- original ou transposto do patrimônio cultural- se faça a partir das matrizes da arte.

Ponto 7
À pagina 104, no item que se identifica pela terminação 035, sugere- se uma nova redação à toda frase, por motivos apontados no próximo ponto, 8. Assim, ao invés da redação atual: “Conhecer e compreender elementos constitutivos do movimento cotidiano e do movimento dançado em seus diferentes aspectos estruturais, dinâmicos e expressivos, considerando a estrutura corporal”, sugere- se a redação que se segue, na qual a inclusão de vocábulos remeteria a uma ampliação dos sentidos deste objetivo: “Conhecer e compreender elementos constitutivos do movimento cotidiano e do movimento dançado em seus diferentes aspectos estruturais, dinâmicos e expressivos, considerando cada estrutura corporal, a partir do desenvolvimento das formas da dança, presentes em sua história tradicional e contemporânea”.

Ponto 8
Como um todo, nos itens organizados nos objetivos de aprendizagem de arte, em forma de tabelas, sente-se a falta de termos específicos deste campo do componente ARTE, assim como de expressões que remetam a manifestações da cultura da dança e da cultura coreográfica, todas elas enraizadas em epistemologias e metodologias trabalhadas no ensino, pesquisa e extensão de universidades que oferecem, além de estudos pós-graduados em dança, bacharelados e licenciaturas específicas no campo, validados por todas as instâncias acadêmicas e institucionais do Brasil e em muitas instituições de ensino de outros países.
Não se fará aqui, como o realizado nos pontos 6 e 7, acima descritos, uma revisão de muitos dos itens que já compõem os quadros de objetivos. Trata-se de para eles sugerir, fortemente, a introdução das menções que se seguem, quando seus conteúdos, de uma maneira mais geral, já estiverem a apontar para tanto.
Finalmente, sugere-se que a menção dos termos e expressões, abaixo agrupados em dois núcleos, deva ser precedida nos textos introdutórios aos quadros, em construções sintéticas, mas explicativas dos mesmos.

Menção de expressões e termos específicos da episteme e metodologia em dança como improvisação, composição coreográfica, consciência corporal, expressão corporal, coreografia, repertório, reposição de obras já estreadas, releitura de obra artística, releitura de manifestação do patrimônio cultural, criação, técnica, sistema, método, partitura coreográfica, etc.

Menção de expressões e termos relativos às formas artísticas e culturais da dança a serem abordadas por especialistas do componente ARTE, como danças de comunidade, danças da cultura, dança de rua, danças da cultura hip hop, danças de salão, danças de tradição, danças populares, danças folclóricas, balé, bale moderno, dança moderna, dança-jazz, dança contemporânea, dança pós-moderna dança-teatro, dança de expressão, etc.

São Paulo, 22 de janeiro de 2016 Por Cássia Navas Alves de Castro
Instituto de Artes, UNICAMP, São Paulo

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